segunda-feira, 15 de setembro de 2008

aqui é o meu país # 1

Antonio Carlos Jobim e Vinicius de Moraes


Estamos no ar. A partir de hoje você começa a conhecer a nossa proposta, ouvir a Rádio Blogue e participar também da sua programação, sugerindo, opinando, criticando, aliás, este nosso primeiro programa dedicado à música popular brasileira é um prato cheio para isso, fruto de um desafio que Bruno Ribeiro e eu nos propomos, estendemos o mesmo desafio ao nosso ouvinte: apontar dentre o vasto repertório da nossa música àquelas que seriam as dez mais representativas, marcantes, que entraram para a sua história, resistiram ao tempo e que basta ouvirmos seus primeiros acordes para identificarmos, portanto, não se trata de escolher unicamente àquelas de que mais gostamos por questões íntimas, pessoais, particulares, muito embora, todas as listadas nos emocione também, faça vibrar nossos corações, sentir orgulho dos compositores que temos e do país que ‘cantaram’ em seus versos. Estou ficando ufanista? Exagero? Bom, depois de ouvirem a lista que o Bruno e eu fizemos, conversaremos melhor.


Seleção musical: Bruno Ribeiro e Ricardo Pereira.


CARINHOSO (Pixinguinha/João de Barro) –
a mais antiga entre as listadas, o choro “Carinhoso” foi composto por Pixinguinha em 1917, mas somente vinte anos depois receberia a belíssima letra de João de Barro (o Braguinha). Apesar de gravado pela primeira vez em 1928, pela Orquestra Típica-Pixinguinha, foi somente a partir do momento em que pôde ser cantado que “Carinhoso” se tornaria um dos maiores clássicos da MPB, registrado em disco por Orlando Silva. Você ouve aqui a gravação feita por Elis Regina em 1966, acompanhada pelo violão de Paulinho Nogueira e pelo Regional do Caçulinha, num dos momentos mais belos da música brasileira.

AQUARELA DO BRASIL (Ary Barroso) –
Nada contra Joaquim Osório Duque Estrada e Francisco Manuel da Silva, mas o hino nacional deveria ser "Aquarela do Brasil". Com ela, Ary Barroso criou o gênero 'samba-exaltação', composição ufanista nos versos, de orquestração e interpretação grandiloqüentes, que marcaria boa parcela das músicas produzidas durante o Estado Novo (1937-1945). Gravada originalmente por Francisco Alves, em 1939, a versão que escolhemos para apresentá-la aqui é bem mais recente, de 1980, extraída exatamente de um disco que a cantora Gal Costa dedicou inteiramente à obra de Ary.

ASA BRANCA (Luiz Gonzaga/Humberto Teixeira) – Composta por Luiz Gonzaga e Humberto Teixeira e lançada em maio de 1947, Asa Branca é a música que melhor identifica o nordeste brasileiro em seu longo trajeto de convívio penoso com a seca. Asa Branca foi eleita pela Academia Brasileira de Letras em 1997 a segunda canção brasileira mais marcante do século XX, empatada com "Carinhoso", e atrás apenas de "Aquarela do Brasil". Embora existam muitas versões para Asa Branca, nada melhor que ouvi-la na voz do Rei do Baião.

CHEGA DE SAUDADE (Antonio Carlos Jobim/Vinicius de Moraes) –
Considerada o marco inicial da Bossa Nova, "Chega de Saudade" aparece pela primeira vez em disco em 1958, no long-play "Canção do Amor Demais" de Elizeth Cardoso, acompanhada pela batida diferente do violão de João Gilberto. No mesmo ano, ela seria gravada por João num disco que leva o mesmo nome da canção. É justamente esta a versão que você ouve aqui.

GAROTA DE IPANEMA (Antonio Carlos Jobim/Vinicius de Moraes) –
Tom e Vinicius são os únicos compositores a emplacarem mais de uma composição nesta lista, um sintoma da importância de ambos na História da Música Popular Brasileira. Composta em 1962, “Garota de Ipanema” é com certeza a nossa música mais conhecida no mundo. Aqui ela aparece na voz de Dick Farney num dos melhores registros desta obra que conheço: melhor que Sinatra.

TROPICÁLIA (Caetano Veloso) –
Espécie de canção-manifesto do movimento musical conhecido como Tropicália que estoura no Brasil na segunda metade da década de 1960, mais precisamente em 1968, trazendo à frente Caetano Veloso, Gilberto Gil, Tom Zé, Gal Costa, Capinam, Torquato Neto, Rogério Duprat e Os Mutantes. A Tropicália retomou o que os modernistas de 1922 começaram a fazer e que ninguém nunca havia tido coragem de continuar: usar elementos dos mais variados, dos arranjos mais diferentes, desde o clássico ao baião, acrescentando também elementos pop, usando nas letras diferentes colagens visuais e discussões estéticas, além de pensamentos revolucionários - uma proposta comportamental que acabou rendendo problemas com a ditadura militar.

FOI UM RIO QUE PASSOU EM MINHA VIDA (Paulinho da Viola) –
Foi o maior sucesso de 1970. Estourou em todo o país e projetou Paulinho nacionalmente. Foi a resposta que a Portela esperava pelo samba "Sei Lá Mangueira", também de sua autoria, lançada anos antes. A resposta de Paulinho tornou-se um hino de exaltação à sua escola e um dos sambas mais executados em todos os tempos, além de obrigatório em qualquer roda de samba.

CONSTRUÇÃO (Chico Buarque) –
Lançada em 1971, após a volta de Chico de um exílio de dois anos na Itália, e ainda no auge da ditadura militar, “Construção” é uma das mais elaboradas composições já feitas, a letra em si é uma construção, em que as proparoxítonas funcionam como tijolos que podem ser montados e desmontados (“Beijou sua mulher como se fosse a última/ como se fosse a única/ como se fosse lógico”). A poesia primorosa ainda ganhou o apoio vocal do MPB-4 e a orquestração de Rogério Duprat, cujos arranjos sofisticados simulam o tráfego que a morte do operário atrapalha.

AS ROSAS NÃO FALAM (Cartola) –
Cartola só conseguiu realizar seu sonho de gravar um disco em 1974, aos 65 anos de idade. Sua vida conturbada e a falta de oportunidades fizeram com que sua obra só fosse conhecida oficialmente num disco lançado pelo produtor Marcus Pereira. Apesar de ter vários de seus sambas gravados nos anos 1930, viveu praticamente no ostracismo as décadas seguintes até ser redescoberto pelo cronista Sergio Porto (o Stanislaw Ponte Preta) na década de 1970. “As Rosas Não Falam” marca o seu retorno ao disco e o imortaliza dentro da história da MPB.

O BÊBADO E O EQUILIBRISTA (João Bosco/Aldir Blanc) –
A música de João Bosco com letra de Aldir Blanc, gravada em 1979, ficou conhecida na voz de Elis Regina como um hino à Anistia que trouxe de volta ao Brasil exilados políticos perseguidos pela ditadura militar como Leonel Brizola, Miguel Arraes, Fernando Gabeira e o "irmão do Henfil": o sociólogo Herbert de Souza, o Betinho. É justamente com Elis Regina - que abriu o nosso programa de hoje - cantando Carinhoso que encerramos esta primeira edição.

No próximo programa: uma homenagem à Dorival Caymmi.
Amanhã tem Pop do Bom aqui. Confira.

13 comentários:

Anônimo disse...

A lista está perfeita, cada música representa uma época e o fato de haver duas da bossa-nova só mostra o quanto esta foi importante para a nossa música. O que me chama a atenção é o fato da 'mais nova' ter quase trinta anos, de lá para cá, na opinião de vcs, não houve nada de mais marcante? Porque se a gente observar bem parece que os grandes nomes da nossa música são hoje ainda sessentões como Chico, Caetano, Gil, Milton. Ninguém mais novo merece estar neste panteão? Estou louca para ouvir o Alma Black. Gostei da variedade, tão diferente das rádios tradicionais que tocam só um tipo de música (e ruim ainda). Parabéns. Beijos, Gabi.

Lucas Dutra disse...

Não seriam "as dez que ninguém aguenta mais"? Quando alguém começa a cantar Chega de Saudade eu até choro de tristeza. Eu só salvaria "Foi um rio que passou em minha vida" daí. Não faz isso comigo não.. HAUHAHUUHAUH

Anônimo disse...

senti falta de algo do Milton, que eu considero nosso melhor compositor, talvez Travessia, Nos Bailes da Vida, Canção da América, estas mais clássicas

Anônimo disse...

Respondendo a Gabi: bons compositores surgiram de lá para cá. Por exemplo: Guinga, Lenine, Celso Viáfora etc. Mas não acho que tenham feito alguma canção que mereça constar numa lista das 10 mais importantes já feitas no Brasil. Talvez, com o passar do tempo, uma nova canção desponte. O bêbado e o equilibrista não nasceu imortal. No ano em que foi gravada, não tinha essa importância toda. Foi justamente o passar do tempo que a revelou perene, imortal e representativa de um momento histórico. E ao Lucas: lembre-se que esta não é uma lista das canções que mais gostamos, mas daquelas que melhor representam a grandiosidade e a riqueza da MPB. Mesmo que a maioria esteja bem desgastada pelos cantores de barzinho. Abs.

Anônimo disse...

Ricardo,
há um problema técnico no programa. Tropicália e Foi um rio... embolam, tocam ao mesmo tempo. Além disso, Garota de Ipanema não tocou na sequência correta... Veja isso.

Ricardo Pereira disse...

Estranho, Bruno, porque aqui toca corretamente, talvez seja a velocidade da conexão...

Anônimo disse...

Acabei de ouvir aqui e tirando uma travadinha de um segundinho no começo de Carinhoso tocou normal.

Radio Indie disse...

Para Gabi: O Bruno e eu acabamos de conversar sobre isso, assino embaixo do que ele respondeu, mas estávamos tentando nos lembrar de canções mais recentes que mereciam ser incluídas nesta lista, até porque as outras que discutimos antes e deixamos de fora eram anteriores a 1979 também. Lembrei-me de Coração de Estudante, do Milton e do Brant. Bruno de Faz parte do meu show, do Cazuza.

Anônimo disse...

Oi Ricardo: citei essa música do Cazuza como uma canção que será lembrada por muito tempo ainda. Mas não acho que ela vá ficar como uma das mais importantes já feitas. "Coração de Estudante" sim tem as características de uma canção atemporal.

Anônimo disse...

Meninos , parabens!!que maravilha trabalhar e ficar escutando musica de verdade!
Nao quero ensinar o Padre Nosso aos Vigarios , mas vao lá duas sugestoes : um programa com os "fora da midia" do Nordeste , como Ednardo , Xangai , Vital Farias , Amelinha , Elomar etc...e os independentes , como Edson Natale , O Terço , Ceumar , Joelho de Porco , Tadeu Franco , Celso Adolfo , Raices de America , etc...

Um grande abraço,

Mane Lagoa

Ricardo Pereira disse...

Mané Lagoa, sugestões anotadas... na verdade no dia 24 dentro do programa Roquenrrou está programado O Terço e Joelho de Porco, além de outras bandas dos anos 1970 que precisamos ouvir muito mais... e o Raíces de America aparece no A Voz da América da próxima segunda-feira.

abraço e nós que agradecemos...

Marcelo Amorim disse...

Como já comentei no Botequim do Bruno, acho a lista bastante justa, apenas um senão quanto à presença da bela "Tropicália". Na minha opinião, no lugar dela deveria estar "Saudosa Maloca", do Adoniran, que apesar de ser bem menos música, é muito mais popular e atemporal, que são dois dos três critérios usados para a elaboração da lista. Um abraço

Ricardo Pereira disse...

Marcelo,
na verdade do Adoniran quase entrou "Trem das Onze", mas justa justa a lista nunca seria, primeiro porque a música popular brasileira é de uma riqueza tão grande que escolher apenas dez já é cometer uma injustiça e segundo que por mais justo que o Bruno e eu procuramos ser, trata-se apenas da opinião de duas pessoas. Em todo o caso, não era para ser uma lista definitiva, mas apenas um ponto de partida para a discussão. Abraço, Ricardo.